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– Eu to te dizendo, a flechinha do mouse se mexeu sozinha.

– Eu acabei de fazer o escaneamento pela segunda vez, e não apareceu nada de errado. Ou teu mouse tá vivo ou tu tá bêbada.

– Quem sabe…

– To sentindo o cheiro de álcool em ti, Bárbara. Cheiro de vinho. Desculpa te decepcionar, mas, teu mouse não tá vivo.

Ela sentou na cama e ficou quieta, olhar fixo em algum ponto daquele quarto bagunçado de roupas por todos os cantos. Estava mais magra, os cabelos mais longos que da última vez.

Manter contato com ex namoradas é algo tranquilo pra mim, mas só depois que não sinto mais nada por elas, o que era o caso. Conversar com uma guria que te fez ficar mal pra caralho, mostrando que você está pouco fodendo pra ela agora, é um sentimento, no mínimo, agradável. Sentei ao seu lado.

– De verdade, por que tu me chamou?

– Lembra da nossa primeira vez?

– Não. – Respondi seco. É claro que lembrava.

– Foi aqui nesse quarto. Nós voltamos da festa da turma e você estava muito bêbado, ficou correndo pelado pelo corredor do prédio…

Ela seguiu falando, sem olhar para mim. Fixei nos seus lábios, que pareciam mais macios agora, e deixei de ouvir o que ela dizia. Naquele momento, bateu um sentimento diferente, algo puramente físico. Eu seria muito idiota se me deixasse seduzir, depois de toda merda que ela fez.

– Tu não lembra mesmo?

– Eu lembro de ti dando pra todo mundo nesse apartamento, isso sim.

Levantei e fui caminhando até a porta.

– Espera! A flechinha mexeu sozinha de novo! Eu vi! Deve ter algum hacker no meu pc!

Voltei e sentei a frente do computador mais uma vez. A flechinha branca repousava imóvel na tela do monitor. Nesse instante, um estrondo se fez ouvir vindo do lado de fora, e o mundo começou a cair em água. Ela sorriu.

Nada me impedia de sair na chuva, mas eu fiquei. Não havia necessidade de levar um banho, molhar toda a roupa, os tênis… Ela deitou na cama, às pernas a mostra pelo short curto do pijama. Não sei por que, mas fingi que não vi o guarda-chuva escorado na parede ao lado da porta. Estava ficando frio e ela se cobriu, deixando só o rosto de fora, agora me olhava.

– Lembra de quando nós ficávamos deitados em baixo das cobertas de tarde quando chovia? Era tão bom dormir contigo…

– Não lembro. Todas as coisas boas de ti eu apaguei. Quis dar uma de bom samaritano arrumando o teu pc e agora to ilhado aqui nessa bagunça, ouvindo besteira.

Ela silenciou de novo. Eu estava sendo grosso, mas sem sentir culpa. Percebi que no mural fixado na parede havia fotos antigas. Em uma delas, nós dois estávamos juntos, sorrindo numa festa. Foi uma época tão boa, talvez por isso machucou tanto. Mas agora eu só queria transar com ela, sem carinho nenhum, um revival da sacanagem, de preferência tomando uma cerveja. E se rolasse um “te amo” por parte dela no meio do sexo, eu interromperia o coito no mesmo instante e iria embora, levando a cerveja comigo.

– Tem cerveja?

Ela levantou e foi na ponta dos pés até a cozinha, estava uma delícia naquele pijama amarelo. Voltou em seguida com uma garrafa de vinho pela metade e duas taças.

– É tudo o que tenho. – Falou num tom irônico e sorriu.

– É quinta-feira Bárbara. Amanhã cedo tenho que trabalhar, e já tá tarde pra caralho. – Eu dando uma de responsável, de novo.

Mesmo assim, abrimos a garrafa e começamos a beber. A chuva não dava trégua. Aproximei a cadeira da cama e ficamos bebendo em silêncio, um olhando para a cara do outro, desviando olhares. Ela estava linda. A verdade é que relacionamentos fazem com que as pessoas fiquem relaxadas. Afinal, por que vou ficar em forma se não preciso mais te conquistar? Quando namorávamos ela era mais gorda, desajeitada. Agora, estava deliciosa.

– Tá te drogando? Essa porra de mouse tá parado faz quase uma hora.

Ela riu. Que merda de desculpa pra que eu fosse lá. Claro, se ela tivesse dito ao telefone algo do tipo “vem aqui em casa, quero te dar loucamente a noite toda”, provavelmente eu não teria ido. Já “o cursor do mouse tá se mexendo sozinho” me fez ir sem pensar muito. Só não esperava encontrar ela tão gostosa.

– Tá frio. Deita um pouco aqui comigo até a chuva passar.

Essa mulher sabia que ia chover, naquela hora, naquele minuto… Tudo parecia planejado. O pior de tudo é que realmente estava frio. Pensei em ir direto ao ponto. Tirar a roupa, deitar ali com ela e maltratar. Entretanto, desci mais um belo gole de vinho e me virei para o computador, aproveitando o impulso da cadeira giratória. Fiquei pensando em quantas vezes eu havia dormido naquele quarto com ela. Noites exatamente iguais, tanto é que eu lembrava apenas das primeiras vezes. Já havia passado tanto tempo. A chuva começou a diminuir. Ao me virar de volta, ela estava com os olhos fechados.

A filha da puta dormiu?

Peguei a garrafa e comecei a beber no bico. Ao menos, acabaria com aquele vinho. Daria uma boa coçada nas bolas, roubaria um guarda-chuva e iria pra casa. Larguei a garrafa vazia no chão e levantei. Fui saindo, quando ouvi:

– Fica mais um pouco. – Seus olhos estavam entreabertos. Sonolenta, ela puxou para o lado a coberta, indicando o espaço vazio ao lado dela, onde, supostamente, eu deveria deitar. Nem pensei muito.

Deitei ao seu lado em silêncio. Apesar do cheiro de álcool, o perfume dela também exalava, e ela estava bem quentinha. Fiquei olhando para o teto, ela pra mim. Por que o ser humano é tão besta?

Só vaze! Mande essa mulher à merda, dê um chute nesse computador, e vaze!

As mãos macias dela tocaram o meu rosto de barba cerrada, mais parecia uma lixa.

Levante dessa cama seu bocó, essa mulher te fez perder um bom pedaço da tua vida!

A mão dela foi descendo, tocando meu peito, e em seguida minha barriga…

Dois anos! Dois anos!

Ela colocou a mão por dentro da minha calça, e sua respiração ficou ofegante. A minha também.

Levantei num pulo.

Tanta mulher por aí, e eu me deixando seduzir por uma ex, a mais vagabunda de todas as ex. Mesmo? Eu deveria era meter um pé na bunda dessa mina! Já tomei o vinho dela, agora posso mandar ela pra puta que pariu e levar um banho de chuva… Um belo banho de chuva? Já tá tarde pra caralho, não tem mais ônibus essa hora. Talvez eu esteja sendo um pouco dramático. Afinal, eu não sinto nada por ela além de tesão. Vou transar com ela e quando acabar, a chuva já vai ter parado. Posso até dormir aqui e ir trabalhar direto amanhã. Talvez eu nem vá trabalhar, e fique transando de manhã também.

É só sexo. – Eu pensei.

– É só sexo. – Ela disse.

Tirei a roupa e deitei.

 

A luz da webcam acendeu sozinha.